Média do RS foi de 51 sacas/ha; clima favorável, genética, manejo e tecnologia garantiram a melhor colheita da família Basso em 60 anos
Conforme a colheitadeira avança pelos campos de trigo a uma velocidade de 3,5 km, o produtor de grãos e sementes Pedro Basso vai alargando o sorriso ao ver os números de produtividade recorde exibidos na cabine. Na segunda semana de dezembro, ele encerrou a colheita em 410 hectares na fria e alta região de Vacaria (RS) com o recorde de 98 sacas de 60 kg por hectare, quase o dobro da média do Estado, que foi de 51,6 sacas por hectare. Em um talhão, chegou a colher 109 sacas. “Nos 60 anos da empresa criada por meu avô e meu pai, nunca colhemos tanto trigo.”
Questionado sobre o segredo de sua produtividade, o gaúcho diz que é resultado de um clima frio altamente favorável em julho, época de perfilamento dos grãos (“até nevou em Vacaria”), do investimento em variedades, tecnologia e manejo, do plantio de cobertura antes de semear o trigo e da opção pela técnica do plantio direto há 35 anos. Foi a primeira vez que ele usou as cultivares RS Feroz e Guardião, da OR, na área em que antes havia plantado nabo e ervilha.
“O investimento em genética foi bem compensador”, diz o produtor e engenheiro agrônomo que destacou ter plantado com um custo de produção bom de 45 sacas por hectare, que vai lhe entregar uma boa margem de lucro.
No total, Basso plantou 1.250 hectares de trigo, com um rendimento médio acima de 90 sacos. “Foi um ano excepcional para o trigo na nossa região. Meus vizinhos colheram uma média de 80 a 90 sacas.” Além da produtividade recorde, ele obteve um trigo de alta qualidade, com PH acima de 80%. A maior parte foi vendida para os moinhos gaúchos, 15% foi para exportação e um percentual pequeno foi para indústria de rações.
As altas produtividades obtidas por Basso e os vizinhos de Vacaria, Sananduva e Passo Fundo foram caso pontuais, segundo Hamilton Jardim, coordenador da Comissão do Trigo da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul). Ele diz que a região de Missões, onde ficam as maiores lavouras, sofreu os impactos de uma estiagem de quase 60 dias, que derrubou a produtividade. Mesmo assim, com quase 1,2 milhão de hectares, um aumento de quase 25% na área plantada, o Estado colheu 3,59 milhões de toneladas de trigo e foi responsável por 80% do produto que vai para os moinhos gaúchos, percentual que era de apenas 30% há alguns anos.
“O ano foi espetacular para o produtor gaúcho de trigo até os 37 km da maratona…”, diz Paulo Rugeri, diretor técnico da Emater-RS, se referindo à corrida olímpica que tem um percurso de 42,195 km. Segundo ele, o produtor investiu na cultura incentivado pelos bons preços diante de custos de insumos em patamares ainda razoáveis e esperava uma safra excepcional, mas a produtividade seguiu o ritmo de uma montanha russa, com excelentes resultados para as primeiras lavouras, uma queda acentuada no meio e uma boa recuperação no final.
“No início, as condições climáticas estavam extremamente favoráveis, mas a chuva pegou parte da cultura na fase de preenchimento de grãos e alguns produtores tiveram que acionar o seguro”, diz Rugeri, explicando que a média de sacas colhidas por hectare depende de quando o agricultor plantou o grão, já que a janela de plantio no Estado era de maio até o final de julho, e da variedade escolhida, de ciclo curto ou longo.
Rugeri conta que não se planta trigo com irrigação no Rio Grande do Sul, mas neste ano, como houve uma estiagem no início, alguns produtores aproveitaram para irrigar o trigo que estava sob os pivôs da soja _não foi o caso do recordista do início do texto.
Basso pretende manter a mesma área de trigo na próxima safra, mas o diretor da Emater e o coordenador da Farsul acreditam em um novo aumento de área plantada no Estado porque os produtores estão capitalizados pela safra recorde de grãos. Ambos, no entanto, ressaltam que o plantio de trigo não é rentável para todos.
“O trigo vem se tornando uma cultura para o produtor que usa o tripé planejamento, profissionalismo e gestão. É impositivo plantar uma cultura de inverno, uma cobertura de solo, e o trigo oferece hoje o melhor retorno, mas o risco é muito grande para quem não se prepara adequadamente porque não temos no sul a mesma previsibilidade de clima que há em São Paulo e em outros Estados de cima”, fala Rugeri.
Jardim completa dizendo que o produtor que ficou no trigo é altamente tecnificado, investe em genética e boas práticas, mas está bem preocupado por conta do aumento dos custos de produção que já enfrentou para a safra de verão.
Paraná e Rio Grande do Sul são os maiores produtores de trigo do país, com cerca de 90%, mas historicamente, a produtividade no sul fica abaixo de outras regiões produtoras devido ao maior risco climático e aos ataques da praga giribela.
No Cerrado, onde a área de trigo cresce ano a ano e já ocupa 200 mil hectares, sendo boa parte irrigada, o risco é menor e a produtividade, bem maior. Em setembro deste ano, por exemplo, o produtor gaúcho Paulo Bonato colheu em Cristalina, Goiás, o recorde mundial de 106,5 sacas por hectare em uma área irrigada de 51 hectares usando uma variedade de ciclo curto.
Fonte: Globo Rural